sexta-feira, fevereiro 11, 2005

Assim

Tenho saudades de escrever como já não me lembrava, mas sinto que as minhas mãos estão magoadas, frágeis e sem forças. A minha cabeça pesa-me e não consigo pensar com clareza. Os sentimentos formam nós que me apertam o coração. O meu coração que é frio e duro como uma rocha, aquele a quem nunca ninguém tem acesso e, portanto, do qual nada sabem. O meu coração é assim... pequeno, gélido e só... Pequeno porque o aperto com as amarras da repugnância do emocional; gélido porque não permito em tempo algum que um raio de luz ou uma onda de calor nele penetre; só porque os outros não fazem nem nunca farão parte dele. É assim, sobrevivente da minha malícia, esquartejado pelas minhas próprias mãos, sufocado pelo aperto de não querer sentir... Eu sou o meu coração. Aquela que não se dá nem deixa que lhe deêm. A que sorri com vontade na presença dos outros, mas chora sozinha no seu canto. Aquela que tem vergonha das suas lágrimas e engole-as com o desgosto num sufoco. A que fica com o sabor amargo na boca das palavras mal ditas, a quem dói os ouvidos por não saber escutar, a que se revolta por não saber compreender. Esta sou eu. A distante, a ausente, a rapariga dos sorrisos frios, das mãos gélidas e dos olhos grandes e baços... Os olhos que já não são janelas para o interior, mas vidros embaciados por entre os quais nada é visível. Sou a rapariga da euforia da rua e da tristeza do quarto fechado. O que sinto está enterrado em mim e nas minhas palavras. Os meus textos são o ponto de luz na escuridão da minha própria incompreensão. São a minha libertação do sufoco das lágrimas secas e dos sorrisos apagados... São o guindaste amável que afasta o peso da minha cabeça. São as mãos delicadas de um ninguém que me massaja os ombros e a face. São a brisa morna de Verão que me oferece uma calma momentânea. Os meus textos são a fonte de serenidade que resta em mim. Deixo nas palavras rudes e desencadeadas o sentimento recalcado do meu coração. Transfiro o meu sofrimento para os textos para sentir o meu próprio alívio. Deixo a vós, palavras, a linha que cose o meu coração, o fogo que queima as minhas mãos, as lágrimas ácidas que corroem os meus olhos, a amargura que me resseque os pulmões e a secura que me empasta a boca. Deixo-vos os meus gritos para que me dêm o silêncio e deixo-vos o meu ser agitado para que eu possa dormir sem pressaltos.

3 comentários:

Anónimo disse...

Gostei do texto, talvez porque me identifiquei com algumas partes dele. Continua a escrever assim :) *****

David disse...

Definitivamente devias publicar um livro com os teus textos, eles são francamente bons, são inspiradores, dão que pensar

tás no bom caminho

jokas

Shore disse...

Sem duvida o texto que mais gostei teu :)

Talvez porque a sinceridade e a humildade se juntam para
fazeram uma dança que tenta descrever o que significa o Blog para ti...

E como eu me identifiquei no que tu disses-te! ... nem imaginas"

Como segui com atençao cada palavra, e o júbilo que me dava ler mais uma frase, uma linha, uma palavra...

És sem duvida um motivo de orgulho nos links do meu blog. E não só...

Aqui fico eu a observar o teu trajecto na confiança de que irás triunfar...

Obrigado por este sorriso que levo daqui, e pelo turbilhão de sentimentos que despertas-te em mim...

Beijo