Era quase meia-noite e o dia estava para acabar. Já deixaria de ser o meu dia. Aquele dia a que todos dão especial importância e o qual, na realidade, pouco siginificado tem. No entanto, havia ainda uma prenda por oferecer. Uma prenda prometida, ainda não cumprida.
Chamei-o. Larguei as folhas que tinha comigo e corri para a casa-de-banho para me preparar. Fiz questão de me vestir de forma provocadora. Usei o vestido que lá ficou da última vez e as meias que ele me ofereceu. Esperava agora pela sua chegada, entre pequenas corridas do quarto para o armário e para a casa-de-banho. A única luz que existia vinha do meu quarto e todo o resto da casa estava mergulhado na penumbra. Não havia preparação. Apenas um corpo quente e um desejo aceso.
A campainha tocou e a voz grave dele no intercomunicador aproximou o momento e aumentou a ansiedade. Subiu e precisou bater à porta porque, ainda na correria, esquecera-me de lha abrir. Rodei a maçaneta e, lentamente e escondendo o corpo atrás da porta, permiti-lhe a entrada. Olhei-o com o sorriso tímido de quem não se encontra totalmente confortável. Olhou-me com o sorriso confiante e satisfeito de quem gosta do que vê, e beijou-me. Prendeu-me em beijos, os dois encostados à porta fechada. Sem palavras, no silêncio da saliva que se partilha entre duas bocas que se desejam.
Não sei quanto tempo passou até ele me puxar pela mão até ao quarto. Entrámos. Eu junto à cama, ele fechando a porta atrás de si. Caí no erro de falar, mas rápido a boca dele abraçou a minha e os nossos corpos caíram na cama. Dois corpos que se queriam ainda antes de se encontrarem. Dois corpos que aos poucos se tocavam, despiam, acariciavam, num êxtase crescente que concretiza a paixão da carne. Esse momento, que eram muitos momentos, criou-se num silêncio que estremecia. No silêncio dos murmúrios, dos olhos fechados, dos corpos quebrados em prazer. Os momentos sofriam metamorfose. Os movimentos amadureciam. Os movimentos de luxúria e os movimentos de carinho. O carinho que passeava na pele, nos sussurros, no abraço dos olhares, de lábios em lábios.
Uma noite. Uma prenda. Poderia ser oferecida em qualquer dia, por qualquer motivo, sem motivo, com o único objectivo de deleitar dois seres que desejam, procuram, satisfazem. Dois seres de paixões. Dois seres de caprichos. E depois, o suor e o odor que desaparecem. E depois, a lembrança que fica. Uma noite que toca onde poucas vezes se sente.
finalizado a 27 de Outbro de 2007