ele saiu
ele saiu e deixou a sua ausência
a ecoar no som dos chinelos de dedo que estalam na tijoleira da casa
deixou a sua ausência no cheiro da morrinha que se funde nas fronhas das almofadas
desenhou a sua ausência no rito de encostar a porta do quarto no caminho para a cama
a ausência não dói por ser agora
a ausência dói pelo futuro
a ausência dói na incerteza do próximo beijo
do novo abraço quente que embala o corpo depois do sexo ou no acto de adormecer
dói um pouco mais ainda por ser uma incerteza solitária
está só comigo
e eu estou à mercê dele
e não sei se o quero
não sei se quero isso
escolho o amor para que doa menos
e amo
e faço por amar muito
ao mesmo tempo que não consigo impedir as lágrimas
que rolam pela minha cara abaixo
nós escolhemos as nossas tristezas, dizem
ou podemos fazê-lo
eu escolhi esta
eu sabia
e agora que a sinto
não sei se a quero